Fale com as Paredes

quarta-feira, março 29, 2006

Era pra ser um comentário no post anterior.

"Urso the kid disse...
Muito legal o poema... só que eu não consigo senti-los de
uma forma tão
simples assim... tá certo que eu os intendo [SIC] lá do meu jeito, mas sei lá entende?(...)"

Urso, voltando a questão dos poemas, acho que, por mais complexos que eles as vezes possam parecer, fica claro que tanto os de Gullar e de Drummond, quanto a música do Gil tratam do fazer poético e da sua dificuldade.
O Gullar e o Gil trazem uma visão mais otimista de um poeta que desafia o impossível, podendo fazer desse algo possível. "Tudonada" pode acontecer na cabeça-lata do poeta. Com uma simples palavra, como "elefante", construímos uma imagem de um animal que pesa toneladas; mas se é dito "um elefante na palma da minha mão" lá está o impossível se fazendo acontecer em imagem mental, é poesia.
No entanto, a poesia também é um problema. Isso é apresentado na primeira parte (da 1ª a 7ªestrofe) do poema de Gullar e sobretudo nos verso "a coisa é fechada à humana consciência". O Drummond aprofunda mais essa questão, dando uma visão que não é chega a ser pessimista, mas gauche, torta. As palavras, elemento básico de qualquer poema, não são absolutas representações da realidade - do contrário não seriam tantas, mas apenas uma, como a própria realidade - elas são estilhaços, cacos, fragmentos de um todo que se perdeu: nossa consciência total e única.
Assim elas funcionam como um filtro que reduz a realidade até um formato em que possámos captá-la. Mas, por serem fragmentos, elas não possuiem um sentido fechado e completo, e mesmo se possuirem esse pode ser moldado de acordo com a nossa consciência. Então, aquilo que se quer dizer nunca é exatamente dito, pode-se dizer mais ou pode-se dizer menos do que o exato sentido "puro" que se pretendia transmitir. Isso ocorre porque as palavras guardam um vazio, próprio da condição humana, que torna impossível a apreensão de qualquer sentido real. É o que acontece no "A máquina do mundo".
É mais ou menos isso.

segunda-feira, março 27, 2006

"eu li isso em algum lugar..."

Metáfora

Uma lata existe para conter algo
Mas quando o poeta diz: "Lata"
Pode estar querendo dizer o incontível

Uma meta existe para ser um alvo
Mas quando o poeta diz: "Meta"
Pode estar querendo dizer o inatingível

Por isso, não se meta a exigir do poeta
Que determine o conteúdo em sua lata
Na lata do poeta tudonada cabe
Pois ao poeta cabe fazer
Com que na lata venha caber
O incabível

Deixe a meta do poeta, não discuta
Deixe a sua meta fora da disputa
Meta dentro e fora, lata absoluta
Deixe-a simplesmente metáfora

letra e música: Gilberto Gil
1982
in Um Banda Um
in GiLuminoso - A Po.Ética do Ser

quarta-feira, março 22, 2006

Dicotomia

quando digo alguma coisa,
quero que essa coisa seja
exatamente aquilo o que digo.
mas o que eu digo são palavras
e palavras são
outra coisa.

terça-feira, março 14, 2006

o jardim está fechado

"adeus, povo. adeus, árvores. adeus, campos."

aos verdejantes ventos de tardes nas folhas das árvores, nos cabelos em minha testa, no sorriso de todas elas, adeus. ao azul das nuvens quentes de vermelho-amarelo poente digo adeus. ao claro marrom do caminho de terra batida da cor da pele encardia, digo adeus.

adeus à chuva carregada, colorida de alegria de uma dança viva e muito fria e muita fria e viva dança de alegria colorida a chuva carregada à deus, adeus.

e pra saudade eu também digo adeus. se olhar pra traz já não é consolo de criança sem idade, que sem querer avança, peço a deus que me dê loucura pra poder olhar pra frente e ver de frente esse mundo de homens - como se da loucura me salvasse a cura.

"Antôe tinha razão"
"herdeiros do fim do mundo, queimai vossa história tão mal contada!"

"aceitai minha despedida"

metáfora

o escuro é o silêncio da luz.